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  1. Sustentabilidade – Duas visões

    20 de junho de 2012


    Na esteira das discussões sobre Sustentabilidade provocadas pela Rio + 20, a visão de dois pensadores sobre o tema chama a atenção para questões relevantes acerca das mudanças de paradigmas que a humanidade precisará enfrentar se quiser legar um mundo melhor para as próximas gerações.

    De um lado o teólogo e filósofo brasileiro Leonardo Boff e de outro o administrador americano Mark Kramer. Duas visões que divergem ideologicamente, mas que trazem contribuições importantes para o debate, e chamam à responsabilidade com que as transformações precisarão ocorrer para que a terra não entre no anunciado colapso.

    O marxista Boff defende que a humanidade está passando por um período de crise, com todos os latentes problemas de ordem social, econômica e ambiental. “Toda crise, pode ser uma oportunidade de aprendizado para uma transformação de valores e comportamentos muito maior”, diz.

    Ao conceito de sustentabilidade, cunhado no Relatório de Brundtland (1987) como o “uso dos recursos naturais que deve suprir as necessidades da geração presente sem afetar a possibilidade das gerações futuras de suprir as suas”, Boff acrescenta a ideia de comunidade de vida. Para ele o homem é parte integrante de uma cadeia, da qual faz parte todo ser vivo e os elementos naturais. Portanto, o uso sustentável dos recursos naturais deve prover as necessidades de toda essa cadeia, que ele chama de comunidade de vida (e não apenas as necessidades humanas).

    O filósofo aponta que a forma com a qual o homem pode garantir a sustentabilidade passa pelo respeito aos limites da biodiversidade. Ele defende, portanto, uma exploração dos recursos respeitando a capacidade de reposição do próprio planeta. Por exemplo, o respeito ao curso natural de rios para pesca e abastecimento de água.

    Defende ainda o crescimento sustentável dos países em que os problemas sociais como a miséria e a fome estão presentes. E uma desaceleração no ímpeto de crescimento econômico dos países em que as condições de vida humana já são dignas. Por isso, o professor rejeita a ideia de que a inovação (necessária para a produção de bens sustentáveis) é dependente do estímulo à competição empresarial - para o teólogo, a necessidade por inovação deveria ser estimulada através do empreendedorismo. “Esta lógica do desenvolvimento, do lucro em cima de lucro, é insustentável”, enfatiza.

    Entre outras propostas, Boff destaca que a humanidade precisa repensar o consumo. Ele não vê outra saída, que não a redução dos níveis de consumo da parcela de 20% da população mundial que consome atualmente 80% de tudo o que é produzido (fonte: Ministério do Meio Ambiente). “O homem, sem a Terra, não sobrevive. Por outro lado, a Terra sem o homem continuará”, cita.

    Outro lado

    Contrapondo esta visão, que relaciona problemas sociais, ambientais e econômicos à voracidade da atividade empresarial, Mark Kramer, consultor americano da FSG, sugere a criação de valor compartilhado (teoria elaborada em conjunto com Michael Porter). Ou seja, envolver a geração de valor econômico de forma a criar também valor para a sociedade (com o enfrentamento de suas necessidades e desafios). “Valor compartilhado não é responsabilidade social, filantropia ou mesmo sustentabilidade, mas uma nova forma de obter sucesso econômico”, defende. (Clique e leia o artigo)

    O capitalista Kramer aponta que as questões sociais e ambientais devem integrar as principais estratégias de uma empresa, uma vez que seria incoerente a atual dinâmica empresarial de impactar negativamente os recursos naturais (matérias primas) e humanos (mercado consumidor) tão necessários à sua perpetuação no mercado.

    Segundo Kramer, para criar valor compartilhado a empresa deve ter em mente qual é o objetivo do seu negócio. Ele cita o exemplo de uma multinacional do mercado farmacêutico que, na Índia se deparou com um desafio: os consumidores potenciais viviam em zonas rurais (apenas 30% da população indiana residia na área urbana) e não consumiam medicamentos, pois não tinham acesso à saúde. Esta empresa investiu em um programa de construção de hospitais e capacitação de profissionais de saúde nestas regiões. Desta forma, “criou” seu mercado consumidor levando, ao mesmo tempo, desenvolvimento social.

    Ele defende o surgimento de um novo modelo de capitalismo em que a criação de valor compartilhado seja o objetivo principal das empresas. “O conceito de valor compartilhado reconhece que as necessidades da sociedade, e não só necessidades econômicas convencionais, definem o mercado”, suscita.

    Apesar da proposição de mudança considerável na finalidade da atividade empresarial (até então focada no atingimento de lucros e distribuição de dividendos), a teoria defendida por Kramer se mostra insuficiente ao não distinguir as grandes multinacionais das pequenas e médias empresas. Para estas, o custo elevado das transformações necessárias para atender à nova dinâmica do valor compartilhado poderia ser um entrave ao desenvolvimento.

    E quanto à questão apontada por Boff em relação à necessidade urgente de redução de consumo, a divergência é evidente. “Não defendo a redução nos níveis de consumo. Muito pelo contrário, defendo o consumo maior, com utilização menor de recursos naturais”, pondera o consultor americano, ressaltando o papel fundamental das inovações tecnológicas para tanto.

    Como percebemos, são visões antagônicas sobre um mesmo tema. Visões estas que contribuem com soluções práticas para a questão. E que, apesar das divergências, concordam em um ponto crucial: é urgente a necessidade de busca por uma solução para os problemas relacionados à sustentabilidade.


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