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  1. Os “sem cultura”

    23 de abril de 2010

    Saindo de um evento de samba em comemoração ao Dia Nacional do Choro, ontem a noite, ouço em tom pejorativo a seguinte frase: “Muitas pessoas de cultura não vêm aqui”. Achei no mínimo pretensioso da parte dessa pessoa que não conheço, pra não dizer pedante.

    Afinal o que define uma pessoa “de cultura”? Será que aqueles que estavam num pagode, ou num baile funk são as pessoas “sem cultura” que não mereciam estar ali?

    Me senti até mal por estar num evento para pessoas “de cultura”. Esta é uma afirmação que só fazem os metidinhos a intelectuais que existem aos montes por aí. Me causa repulsa.

    Será que ele sabia que o choro surgiu, no século XVIII, de uma mescla da cultura erudita da época -entre elas a valsa européia - com ritmos africanos? Muitas das pessoas “de cultura” daquele período torciam o nariz para o que acreditavam ser uma vulgarização cultural.

    E o samba que era a música popular dos morros do Rio - o que hoje equivaleria ao funk em termos de popularidade. Imaginem só, daqui há uns 50 anos, um evento “de cultura” que toque o funkadão “de raiz”. O grande sambista Ataulfo Alves, em parceria com Wilson Batista, cantou em 1940: "não posso mais, eu quero é viver na orgia". Quantas letras do famigerado funk não querem dizer a mesmíssima coisa?

    Não estou querendo misturar "alhos com bugalhos" e nem discutindo aqui o gosto musical de ninguém. Não gosto, por exemplo, de funk (mas também, como muitas pessoas que se dizem “de cultura”, não consigo deixar de me mexer quando toca o “batidão”). Gosto menos ainda, porém, de quem menospreza uma autêntica manifestação cultural, seja ela qual for.

    Músicos considerados “de cultura” gravaram os “sem cultura”, e a coisa se tornou “cult” da noite pro dia. Adriana Calcanhoto, por exemplo, gravou Claudinho e Buchecha (que eu já confessei a uma amiga gostar muito), e muita gente que torcia o nariz passou a cantar.

    A mais nova “cult” das paradas, Maria Gadú, pode ter transformado em clássico da MPB (?), a clássica “sem cultura” Baba Baby, da Kelly Key.

    Marisa Monte, a cantora de MPBs, Sambas, Choros e Bossas Novas, ao cantar “jujuba, goiabada, sorvete”, não soa tão diferente da Xuxa cantando “hoje vai ter uma festa, bolo e guaraná muitos doces pra você”. Só pra citar alguns exemplos.

    Por isso hoje, mais do que nunca, quero deixar aqui o meu protesto: Abaixo ao preconceito musical! Abaixo à hipocrisia cultural!